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Projeto de escritor. To sempre de malas prontas pra lugar nenhum por que até hoje não achei casa alguma dentro de mim. (Pra saber mais, clique ali em Quem eu sou, à direita)

domingo, 31 de março de 2013

Europeus


Ela sussura mon petit prince, eu respondo ich liebe dich. Sua pele branca como porcelana contrasta com a minha mais morena. Dividimos gostos, enquanto ouço Cícero, ela vai no embalo de Jeneci. Eu devo estar vendo filmes demais, imaginando em excesso, me faltam pés no chão. Estou como minha pequena, sonhando alto, com a cabeça nas nuvens. E entre um pé no realismo e a ficção e outro na literatura, tudo o que posso fazer é escrever. Durante sua ausência na minha pele, restam as minhas mãos escrever.
            Sucumbindo à vontade, mas não a qualquer vontade. Ainda não sei onde isso vai me levar, nem mesmo se sairei ileso. O fato é que algo mudou quando te vi, quando nossos olhares cruzaram. Uma ligação nunca sentida antes, algo indecifrável, indescritível, inimaginável. Estou perdido. Perfeitamente perdido, perdidamente apaixonado. E eu espero que isso dure. Trocaremos línguas, tocaremos nossas línguas. Eu direi ich liebe dich e ela responderá jet'aime.

domingo, 24 de março de 2013

Novo dia

Novamente seria uma noite longa. Podia prever que não seria uma conversa fácil. Os passos na escada anunciavam a sua vinda, mesmo que Pablo continuasse a desenhar. Ao entrar no quarto se escorou na porta e ficou apenas observando aquele homem magro e concentrado. Por um momento nada foi dito, apenas observado. Como as pequenas imperfeições da ponta de seu lápis, os traços levemente tortos e as milhares de folhas caídas pelo chão. 
- Então, vai ficar aí?
Não foi ouvida nenhuma resposta. Provavelmente a conversa tomaria rumos que todos gostariam de evitar. Mas mesmo assim era preciso, necessário. Algumas coisas na vida são necessárias, mesmo que doam muito, e por muito tempo.
- Olha, eu vou sair, e espero que você me acompanhe.
- Eu não vou a lugar nenhum - retrucou.
- E vai fazer o que? Ficar aí, desenhando a noite toda? Olhe para você, parece um fantasma. De tanto tempo que está aí parado certamente poderia se transformar em parte da mobília. Todos nós sabemos o que aconteceu, mas nada justifica vocÊ se esconder no seu quarto e transformá-la em uma caverna em que nenhuma luz ou pessoa entra. Você está muito tempo aí e precisa sair. O mundo está lá fora...
- O meu mundo acabou, faz tempo. Não há nada lá fora para mim - interrompeu-o
- Ok, e o que você fez para mudar isso? Dê uma chance a você mesmo. Dê uma chance às pessoas lá fora. Você simplesmente construiu essa realidade e aposentou a vida real, aquela que lhe pode tirar daí. Tudo o que você respira é dor, está envolto por lembranças e essas lembranças vão te matar, se é que ainda restou algo aí. Nesse quarto há um conglomerado de  memórias, sonhos interrompidos e decepções. Isso tudo o impede de seguir. Seu quarto é um reflexo seu, é um vazio cheio de coisas que não pode suportar. Você não lê mais, pois a única palavra que reconhece no momento é 'vergonha'. E essa vergonha te impede voltar a viver. Você não desenha mais pois tudo o que sabe fazer é repetir os mesmos traços do rosto dela e tudo o que você vê é distorcido, não há tanto mal assim, apenas aquilo que você carrega. Eu ainda espero que você saia desse quarto algum dia.
Pablo acordou assustado do seu sonho. Olhou para o lado e viu seus livros, olhou para baixo e visualizou suas folhas no chão. Eram 7 e meia, segundo o relógio. Levantou as persianas e abriu a janela. Deixou um pouco de sol entrar como não fazia meses. Era um novo dia.


domingo, 17 de março de 2013

Kentucky

“Olhe para você. Patético. Todas as noites você faz as mesmas coisas, lembra-se das mesmas memórias, bebe o mesmo uísque, dorme na mesma hora. É hora de tirar a poeira dos ombros, de respirar novos ares. Você não pode ficar o resto da vida nesse quarto, isolado do mundo. O seu ano sabático precisa acabar em algum momento, e até acredito que sabes disso. Uma hora ou outra as desculpas não vão mais ser o bastante. Desde Kentucky, você não lança mais nenhum livro e eu sei como é ruim a fama e ainda mais perder uma pessoa amada, mas você precisa viver.
É tudo que você precisa nesse momento e a única coisa que não está fazendo, e uma hora ou outra será obrigado a fazê-lo. Lembra-se antes dela? Você tinha uma vida, você tinha um destino e tinha esperanças e olhe o que aconteceu com você. Ela passou como um furacão e deixo apenas migalhas do que era te destruiu, como um tornado que pelo meio de uma fazenda e arrebata os pobres animais, derruba as paredes e não faz resta nada além de destroços. Você está assim faz meses, e nada mudou. As contas estão chegando, as pessoas perguntam pelo senhor e esperam te ver. Deus queira que ninguém o veja assim. Seus sentimentos são uma parnafenalha, olha-se no espelho e não sabe quem é mais. E olhe, eu sei que você tem essa tendência de ser introspectivo, mas não é necessário tudo isso, todo esse silêncio. Todos seus amigos deram um jeito na vida e você continua vivendo o mesmo momento, tolo. Buscas pelo passado como as civilizações buscam pelo Elo Perdido, como os marinheiros pela cidade de Atlantis e no final, você sabe que não irá recuperar aquilo que já passou.

É hora de recomeçar, uma hora ou outra o cavalo passará encilhado e tudo o que precisarás é coragem para subir nele. É claro que uma musculação não cairia mal, afinal, você está todo enferrujado. E trate de fazer a barba, sua pele anda branca, precisas ver um pouco de sol. Tente mais uma vez, como você tentou antes dela, como já fez outras vezes, como acreditou em situações mais difíceis, confiou quando pareceu improvável e se mostrou forte quando não precisava. Pare de pensar, imaginar, desejar que as coisas fiquem ruins novamente para ter que agir de última hora e fazer algo impensável. Passou da hora de se lamentar, é o momento de se reinventar. Todos anseiam por isso, inclusive o senhor. Eu ainda acredito nisso”. 

domingo, 10 de março de 2013

Espelho

"Ninguém conhece esses sentimentos, mas todo mundo entende. Sabe, todos dizem: “eu entendo”. Mas ninguém vagou pelo vale das sombras até isso virar o seu mundo, tudo o que você conhece. E isso arde, adentra meus músculos até chegar aos ossos. Isso me corrói por dentro, suga todas as minhas forças. Não há como me recompor ou me levantar. Esse ódio é muito maior que meu corpo e me mata, como uma rodada de facadas. Mas toda noite acaba, e surge um novo dia pela manhã. É nessa hora que eu pratico sorrisos na frente do espelho. Eu estou tentando ficar bom nisso."

domingo, 3 de março de 2013

Mulheres

As expressões femininas sempre me intrigaram. Eu nunca soube decifrá-las. Elas são um mundo a parte, como paredes de um labirinto em constante mudança, com pétalas cheias de cravos. Tão vulneráveis e tão fortes ao mesmo tempo, firmes como rochas, maleáveis como argila. Com seus sorrisos transparentes que transbordam mil sentimentos, embora escondam outras mil inseguranças. Por trás de cada olhar atento existe uma busca: do parceiro ideal, da situação financeira desejada, da tão esperada independência. Deveriam ser estudadas por cientistas, talvez esse sim seja o grande segredo do universo.
As mulheres comandam o mundo. As mulheres podem levar um homem à falência. Regem regras nessa nação, a moda, a beleza, a ditadura, a tendência, desde Helena de Troia, Cleópatra, Joana D’arc. Indivíduos tão perigosos, tão dissimulados, portadoras de mil e uma faces. Kennedy, Obama, Jesus, quem seriam esses homens sem as mulheres? Capazes de nos dar prazeres inimagináveis, trazer dores inacabáveis, musas para os poetas, inspiração para escritores, motivação para qualquer homem em qualquer idade. Diabos vestidos em vestidos que os caem tão bem, tão bonitas em suas curvas, sutis em seus traços, belas em seus defeitos.
Esses seres sempre regeram a minha vida, do princípio até hoje, comandando meus pensamentos, ações, ideias. Eu sou apenas um escravo da beleza de todas, encantado como uma criança que vê o céu pela primeira vez. Seres que nasceram para distribuir amor, aos maridos, aos filhos e aos netos, mas que se mostram tão resistentes a entregar esse sentimento, quando no fundo um dos seus maiores desejos é esse: ter a quem acolher, a se deixar levar, a partilhar o seu mundo.

Eu sou um tolo, um grande tolo em relação à essas criaturas divinas. Eu nunca saberei o que se esconde atrás de pequenos sinais, mas continuarei um pueril enfeitiçado pela sua beleza, por suas dores, sonhos e conquistas. Todas as mulheres da minha vida me encheram de certezas e então me cobriram de dúvidas. Cada mulher é um continente a ser desvendado, uma ilha de segredos, um universo paralelo de infinitas possibilidades.